No dia 23 de julho de 2022, a Organização Mundial de Saúde (OMS) decretou que o surto da varíola dos macacos (Monkeypox) representa uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional. Três dias depois, em coletiva de imprensa, a líder técnica da OMS sobre a varíola dos macacos, Rosamund Lewis, classificou como “preocupante” a situação no Brasil, país onde já foram registrados quase mil casos da doença, sendo o Rio de Janeiro o segundo estado com maior incidência (177).
Diante desse cenário, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) escolheu a varíola dos macacos como primeiro tema do “Fala, Minerva!”, série criada para que especialistas da academia respondam às perguntas da sociedade de forma clara e simples. O debate com especialistas aconteceu dia 28 de julho na Inovateca, prédio que integra a infraestrutura do Parque Tecnológico da UFRJ.
O evento híbrido, do qual participaram alunos, especialistas, imprensa e a sociedade em geral, foi aberto pela reitora da UFRJ, Denise de Carvalho. O grupo de pesquisadores da universidade que falaram sobre a varíola dos macacos era composto por Clarissa Damaso, Rafael Galliez, Amílcar Tanuri e Terezinha Marta Castiñeiras.
“Em tempos de infodemia, as pessoas precisam escolher em que fontes devem confiar. E são nessas pessoas presentes aqui hoje que devemos confiar. Cada especialista que falará aqui hoje não é apenas graduado numa profissão, é um profissional que após a graduação se pós graduou em cursos que são credenciados, que têm nível internacional, e que após esse percurso que dura décadas, incluindo o pós doutoramento de muitos deles nas melhores instituições do mundo, podem retornar todo esse investimento que é feito para a sociedade que nos mantém”, frisou, durante a abertura do evento, a reitora da universidade, Denise de Carvalho.
Ainda em alusão a uma sociedade onde há excesso de informação, a reitora reforçou a necessidade de discernimento para detectar a informação científica embasada, em detrimento de fontes com outros vieses. “É muito importante que saibamos a diferença entre instituições de pesquisa e as que representam classes profissionais. Trago isso porque temos conselhos profissionais, temos sociedades de classes, mas essas sociedades têm interesses diversos relacionados às diferentes profissões. Não são essas as sociedades que têm que responder num momento de crise como o atual. Devem responder as sociedades científicas, onde existem os maiores especialistas que estudam e produzem conhecimento”, disse.
Ao citar especialistas das mais diferentes áreas, da saúde à tecnologia, presentes no evento, a reitora ressaltou a importância dessa interação. “Esse é o século no qual as áreas não serão mais tão diferentes. Elas precisarão interagir. E é essa intersecção entre os diferentes saberes que fará com que a nossa sociedade avance como uma sociedade mais equânime, mais justa, onde haja mais qualidade de vida”.
O ciclo de palestras foi aberto pela pesquisadora Clarissa Damaso, que fez um apanhado geral sobre a varíola dos macacos. Poxvirus da família dos orthopoxvirus, a varíola dos macacos é um vírus de baixa letalidade que não é novo: foi detectado pela primeira vez em 1958, na Dinamarca, num grupo de macacos. Foi daí que surgiu o nome Monkeypox, embora a doença advenha principalmente de roedores silvestres.
A pesquisadora destacou a similaridade de 80 a 96% entre o vírus monkeypox e o vírus da varíola. No entanto, diferente dos 30% de letalidade da varíola, o Monkeypox apresentou entre 1% e 10% de letalidade em países africanos. “A vacina contra a varíola também protege contra o poxvirus e outros orthopoxvirus”, pontuou Damaso. No entanto, com a erradicação da varíola e posterior suspensão da vacinação contra a doença, variantes surgiram pelo mundo, como o vírus Cantagalo, o cowpox e, mais recentemente, o monkeypox.
Ao enfatizar o salto de 19 para 978 casos da varíola dos macacos no Brasil em apenas cinco semanas, Damaso reforçou que é preciso evitar que o vírus encontre reservatório em outros países, porque isso dificultaria a contenção e facilitaria o surgimento de surtos da doença em outros lugares que não o continente africano.
Para o pesquisador Amílcar Tanuri, o problema não é entender o vírus. “Esse vírus nós sabemos como lidar. A meta é erradicar o vírus”, disse, e complementou: “Uma saída seria desenvolver um teste de antígeno para detecção rápida do vírus. A questão é testar, testar, isolar, tratar os casos graves”.
De acordo com o pesquisador, a UFRJ se disponibilizou, desde o início da frente de trabalho organizada pelo Ministério da Saúde contra a varíola dos macacos, a funcionar como um centro de testagem. Até o dia 28 de julho, foram testados 266 pacientes, sendo 127 positivos. Uma positividade de 47,7%.
A doutora Terezinha Marta Castiñeiras falou sobre a droga que tem se mostrado mais eficaz contra a doença, que se chama Tecovirimat. No entanto, ainda não está disponível no Brasil para uso em larga escala.
Uma outra frente apontada por Castiñeiras foi a imunização com vacinas baseadas no vírus vaccínia, o mesmo que combate a varíola. No entanto, a produção desse tipo de vacina também é limitada, já que a varíola foi erradicada. “Essas vacinas são produzidas basicamente contra o bioterrorismo. Então, a demanda está mais alta que a oferta. Por isso, não será possível a vacinação em massa, e sim focar na vacinação de contactantes pós-exposição e profissionais de saúde em situação de exposição. Esse uso será discutido semana que vem pela OMS”, explicou a pesquisadora.
Veja o debate completo no canal da UFRJ no Youtube
Sobre a varíola dos macacos
A varíola causada pelo vírus hMPXV (Human Monkeypox Virus, na sigla em inglês) provoca uma doença mais branda do que a varíola smallpox, que foi erradicada na década de 1980.
Trata-se de uma doença viral rara transmitida pelo contato próximo com uma pessoa infectada e com lesões de pele. O contato pode ser por abraço, beijo, massagens ou relações sexuais. A doença também é transmitida por secreções respiratórias e pelo contato com objetos, tecidos (roupas, roupas de cama ou toalhas) e superfícies utilizadas pelo doente.
Não há tratamento específico, mas os quadros clínicos costumam ser leves, sendo necessários o cuidado e a observação das lesões. O maior risco de agravamento acontece, em geral, para pessoas imunossuprimidas com HIV/AIDS, leucemia, linfoma, metástase, transplantados, pessoas com doenças autoimunes, gestantes, lactantes e crianças com menos de 8 anos de idade.
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