Fonte: O Globo |
É difícil comparar o Vale do Silício, nos EUA, com qualquer outro lugar. Afinal, a região reúne as maiores empresas de tecnologia de ponta do mundo, como Google, Apple, Facebook, eBay, Yahoo!, entre tantas. Mas o Brasil também abriga os seus vales. São parques tecnológicos e polos de inovação que crescem em todo o país, entre os quais se destacam cinco: o maior deles, o Porto Digital, no Recife; o Parque Tecnológico da UFRJ, no Rio de Janeiro; o San Pedro Valley, em Belo Horizonte; o Parque Científico e Tecnológico da PUC/RS (Tecnopuc), em Porto Alegre; e o Parque Tecnológico de São José dos Campos, no estado de São Paulo. Estes também abrigam grandes companhias, como Dell, HP, Embraer, Schlumberger, Siemens, além de muitas outras de menor porte e startups. Ao todo, são 634 empresas que empregam mais de 15 mil pessoas e faturam acima de R$ 1,4 bilhão ao ano.
Um estudo da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) de 2008/2009 apontou para a existência de 11 parques tecnológicos em funcionamento, número que já aumentou, de acordo com o diretor do Tecnopuc, Rafael Prikladnicki. Existem, hoje, no país, mais de 90 projetos e cerca de 20 em operação, sendo que alguns em estágio mais avançado — além destes cinco, há outros menores em vários estados.
— A vocação de cada parque contribui para o desenvolvimento da capacidade empreendedora e inovadora do Brasil — destaca Prikladnicki.
Cada um desses centros tem características próprias, que os aproxima, cada qual a sua maneira, do Vale do Silício. San Pedro Valley, em Belo Horizonte, leva o vale no nome — justamente uma brincadeira com o polo americano de inovação. Mas, diferente do Silicon Valley, que nasceu em torno da Universidade de Stanford, San Pedro não surgiu associado a qualquer instituição educacional. Depois que a Google instalou um braço de tecnologia e engenharia na capital mineira, muitas startups de tecnologia começaram a ser criadas, concentrando-se no bairro de São Pedro. As quase 200 empresas da região, que devem faturar, em 2014, R$ 200 milhões, passaram a atrair universidades, instituições como o Sebrae e o governo estadual, que lançou o programa SEED (Startups and Entrepreneurship Ecosystem Development).
Já os parques tecnológicos da UFRJ, na Ilha do Fundão, e da PUC-RS, o Tecnopuc, têm por trás a chancela das universidades, enquanto o Porto Digital, do Recife, e o Parque Tecnológico de São José dos Campos têm parcerias com várias universidades. O intercâmbio entre academia e mercado é uma das premissas do Vale do Silício que esses polos replicam.
— É natural se espelhar no Vale do Silício, mas há vários gaps culturais, de políticas públicas, do macroambiente de inovação, que ainda distanciam muito o Brasil dos EUA. Por isso, é errado fazer um “copia e cola”. Temos que encontrar o nosso modelo, baseado na ideia de tripla hélice, que é a convergência de academia, indústria e governo — pontua o gerente de Inovação Estratégica da Firjan, Carlos Coelho.
AGLOMERAÇÃO PROPICIA A INOVAÇÃO
O sucesso dos polos de tecnologia e inovação se dá, principalmente, pela questão da concentração. É o que garantem os responsáveis pelos principais centros do Brasil.
— A capacidade de inovação não depende apenas de um departamento de uma empresa, mas de vários outros agentes, como a convivência com clientes, fornecedores e até concorrentes. Por isso, parques tecnológicos, como ambientes onde essa capacidade de inovação é maximizada, têm se difundido no mundo inteiro e no Brasil — destaca Mauricio Guedes, diretor do Parque da UFRJ, que alerta também para o risco de “modismos”. — Para que haja expansão, é fundamental haver consistência com as vocações e com a capacidade local.
PORTO DIGITAL (PERNAMBUCO)
O Porto Digital do Recife é um dos maiores polos de tecnologia e inovação do país: são 7.100 funcionários em 250 empresas, faturando R$ 1 bilhão ao ano. Quando começou a operar, no início de 2001, contava com três empresas e 46 funcionários. A meta é, até 2024, ter 20 mil pessoas nas áreas de tecnologia da informação e comunicação (TIC) e economia criativa, as duas grandes vocações do polo.
Francisco Saboya, presidente do Porto Digital, aponta alguns fatores para o sucesso do empreendimento, entre eles, a gestão por meio de uma Organização Social (OS) e a escolha por uma região do Recife que precisava de revitalização:
— Ao delimitar um território, promove-se o efeito sinérgico da aglomeração. Juntando empresas e pessoas concentradas cada vez mais num local gera-se o efeito da cooperação, ativo do qual todas se beneficiam — diz Saboya, frisando que hoje o Porto atrai profissionais de todo o Brasil e do exterior.
SAN PEDRO VALLEY (MINAS GERAIS)
San Pedro Valley brinca com o nome do vale americano, em função da concentração de startups no bairro de São Pedro, em Belo Horizonte. Hoje são 188 startups, quatro aceleradoras, sete incubadoras, seis investidoras e 15 espaços de coworking na região.
— O principal bairro da cidade é a Savassi, mas é uma região cara para quem está começando, por isso muitos empreendedores foram para São Pedro, que fica próximo. As pessoas começaram a se esbarrar e a brincar que parecia “San Pedro Valley” e, há três anos, a brincadeira acabou virando marca — conta Rodrigo Cartacho, da Sympla, startup há dois anos e meio no vale mineiro.
O polo foi impulsionado também pela instalação da Google, que tem sua unidade de engenharia na capital mineira.
— Em BH há um contato bem grande entre startups, um ecossistema orgânico onde todos se ajudam — destaca João Drummond, fundador da Yoozon.
PARQUE TECNOLÓGICO DA UFRJ (RIO DE JANEIRO)
Inaugurado há 11 anos, o Parque Tecnológico da UFRJ aposta na vocação para as áreas de energia e petróleo, mas começa a receber empresas também de outros segmentos, como a L’Oréal, que está construindo seu centro de pesquisas na Ilha do Fundão. Lá já estão instaladas 46 companhias, sendo 12 grandes, oito pequenas e 26 startups na Incubadora da Coppe/UFRJ, que empregam 1.500 pessoas.
— A vinda do centro de pesquisas da Petrobras, no início dos anos 1970, foi um passo fundamental para criar as condições que o Parque tem hoje — diz Mauricio Guedes, diretor do Parque Tecnológico da UFRJ, ressaltando que há, no país, um movimento de valorização de parceria entre mercado e academia que se reflete na criação de parques tecnológicos. — As universidades se abriram para essa possibilidade. Além disso, aumentou a percepção de que os processos de inovação pedem um ambiente propício para que ela aconteça.
TECNOPUC (RIO GRANDE DO SUL)
Regis McKenna, um dos responsáveis por colocar o Vale do Silício no mapa, afirmou, depois de visitar o Parque Científico e Tecnológico da PUC/RS, o Tecnopuc, em Porto Alegre, que este foi o polo que melhor reproduziu o que conhece do centro de TI americano.
— Os aspectos invisíveis criam essa semelhança: o relacionamento, o intercâmbio de ideias — diz Rafael Prikladnicki, diretor do Tecnopuc.
No local, há 120 empresas, entre elas Dell e HP, que geram seis mil empregos — muitas mantêm centros de pesquisa no local e o faturamento não é divulgado.
— O objetivo é ser um polo de inovação onde haja desde startups até empresas âncoras multinacionais, que desenvolvam projetos de forma integrada com a universidade — frisa Prikladnicki.
A vocação natural do Tecnopuc está na área de TIC, mas há espaço para energia e meio ambiente, ciências da vida e indústria criativa — esta última, aliás, uma nova aposta.
PARQUE TECNOLÓGICO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS (SÃO PAULO)
Um hub do setor de aeronáutica, defesa e espaço. Assim é conhecido internacionalmente o Parque Tecnológico de São José dos Campos (PqTec – SJC), em São Paulo. Não é à toa, pois Embraer, Boing e Airbus mantêm centros de desenvolvimento tecnológico na região — assim como a Vale e a Ericsson, que diversificam a atuação do parque.
Além das grandes, há 25 pequenas e médias empresas que atuam no polo de São José dos Campos, faturando em torno de R$ 40 milhões ao ano. Até o fim de 2014, mais 50 passarão a funcionar em um novo prédio, o que fará com que o Parque empregue 1.600 profissionais — atualmente, são 950 pessoas.
— As oportunidades são para engenheiros e pós-graduados de diversas áreas, assim como para pessoas com formação técnica em vários níveis — afirma o diretor geral, Horacio Aragonés Forjaz, acrescentando que a tendência é a abertura de novas vagas. — Novas empresas vão se instalar.