“Não vivemos uma era da mudança, mas uma mudança de era”. A frase de impacto do físico e escritor britânico-estadunidense Chris Anderson foi usada por toda a década 2010 nos diversos contextos que abrangem a sociedade do conhecimento e suas reflexões.
No nosso evento online “Redes, dados e as cidades do futuro”, ocorrido no dia 31 de agosto, o professor Marcos Cavalcanti também utilizou a sentença no início da sua fala. A partir dela, o especialista em gestão do conhecimento começou a destrinchar a mudança de mentalidade necessária para que o desenvolvimento da sociedade acompanhe o ritmo das mudanças tecnológicas que nos atingem de maneira cada vez mais acelerada.
“A mudança da qual falamos é a transição entre a sociedade industrial e a sociedade do conhecimento. O que sempre foi feito não consegue dar conta da vivência em um mundo cada vez conectado, digital. Vamos precisar de habilidades que não foram desenvolvidas nas escolas tradicionais e esse cenário de disrupção vale para pessoas, para empresas e para cidades”, afirma o doutor em informática.
Para o coordenador do Centro de Referência em Inteligência Empresarial (Crie), a Internet se espalhar por todos os cantos do mundo é uma questão de tempo. “As 5 maiores empresas do mundo (Amazon, Google, Apple, Microsoft e Samsung) dependem da Internet para exercer seu poder. É a única forma que eles conseguem entregar valor. O desenvolvimento da cidade inteligente também depende da democratização da Internet”, explica.
Planeta em rede
As redes são complexas e entendê-las é primordial para que consigamos entender o que é a sociedade do conhecimento. Para Cavalcanti, conseguir enxergar o mundo em termos de rede é essencial. O valor destas redes reside no fato de que estamos todos conectados: cidadãos e empresas.
“A mudança de mentalidade é urgente. A escola do futuro, por exemplo, não pode ser um espaço físico onde as pessoas vão para receber informações. O conhecimento está disponível na Internet. A escola terá que ser outra coisa, os alunos precisam desenvolver a capacidade de se expressar, usar a própria linguagem, pensar com a própria cabeça”, acredita Marcos.
O pesquisador reforça que serão necessários outros modelos mentais, educacionais, de saúde, outro modelo de gestão da cidade. “Por exemplo, já é de conhecimento geral que prevenir é muito mais barato do que cuidar de doentes. Na França, há investimento público para que os cidadãos realizem exames preventivos aos 35 anos. E a mineração dos dados sobre as pessoas pode ajudar muito nesse aspecto”, aponta.
Dados e sociedade: qual o caminho?
A utilização dos dados dos cidadãos é um tópico que gera uma série de discussões, inclusive a respeito da privacidade. No Brasil, por exemplo, foi aprovada em 2018 a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). A aprovação ocorreu em meio a um momento de intensificação dos questionamentos sobre como megaempresas (como o Facebook) estavam utilizando estas informações coletadas nos acessos à Internet.
No entanto, Cavalcanti acredita que existe um caminho a ser adotado que leve em conta os direitos de cada um à privacidade, mas que esses dados sejam analisados para melhorar a qualidade de vida das pessoas e seu uso represente mais desenvolvimento para a sociedade.
“Eu pensei no projeto do Nelson Ebecken, da Coppe, com a Petrobras. Trata-se de sensores no fundo do mar para monitorar a qualidade da água e identificar rapidamente caso haja algum vazamento em plataformas sem que chegue à superfície. E se usássemos um sensor parecido nos vasos sanitários das pessoas, por exemplo? Esses dados poderiam permitir à ciência descobrir correlações que ajudariam no combate às mais variadas doenças. As possibilidades são incontáveis”, aponta.
Para o especialista, as mudanças durante o distanciamento social ajudam a interpretar caminhos que, provavelmente, não terão volta. “Não vamos voltar à ‘normalidade’ anterior. A realidade do trabalho já mudou, a questão da mobilidade está sofrendo uma transformação violenta. Em Nova York, 20% dos imóveis comerciais estão vazios. Mudanças que já estavam no horizonte foram muito aceleradas”, reitera.