A primeira fase do Lean Startup Program terminou nesta quarta-feira no Parque Tecnológico da UFRJ. As jovens empresas se dedicaram fortemente às tarefas designadas e apresentaram os primeiros resultados de suas entrevistas com potenciais clientes. A missão era chegar com pelo menos dez entrevistas, mas houve quem fizesse até mais de vinte, depurando seu modelo de negócio e adaptando seu produto para novos mercados.
Mas, afinal, o que é o programa da “startup enxuta”, numa tradução livre do inglês? Adotado pelo Innovation Acceleration Group da Universidade da Califórnia em Berkeley e trazido para a Coppead/UFRJ em parceria com o Instituto de Educação para Empreendedores (IEPE), via a gestora de fundos de capital Antera, o método confere velocidade e confiabilidade à busca de uma startup pelo sucesso. Resumindo, em vez de ter uma ideia bacana e achar que ela é perfeita para o mercado, o empreendedor deve partir de outro princípio: uma hipótese, que deve ser adaptada ao mercado como uma luva se adapta à mão.
Para testar essa hipótese, a startup tem que fazer dezenas, quiçá centenas de entrevistas para descobrir quem é seu verdadeiro cliente. Muitas vezes, ele está em outro lugar, bem diferente do pensado inicialmente. Vários exemplos foram dados pelos professores de Berkeley no parque, André Marquis, Mark Searle, Flávio Feferman e Elizabeth Saunders. E as startups foram se amoldando à nova metodologia.
A Saga Labs, para citar uma, trabalha com aplicações de realidade virtual para fins educativos. Se de um lado um cliente natural seriam as escolas, por outro o treinamento em empresas do setor de óleo e gás também pode se beneficiar da ideia.
– Em vez de reunir um grupo de funcionários ao redor de uma estrutura física ao mesmo tempo, num esquema presencial, cada um poderia, com um capacete de realidade virtual, visualizar a mesma estrutura examinando-a de vários ângulos – explica David Júnior, um dos sócios da Saga Labs. – O investimento inicial nos capacetes seria compensado com as futuras aplicações virtualizadas, que seriam customizáveis de acordo com as necessidades da empresa.
Outros produtos imaginados precisam passar discussões éticas antes de chegarem aos clientes em potencial. É o caso do Lab IDOR, do Instituto D´Or de Pesquisa e Ensino, cuja missão é, usando a biotecnologia, criar uma medicina personalizada à base de derivados da cannabis. Segundo o sócio Rodrigo Madeiro, biólogo com pós-doutorado em neurociência, a ideia é usar células do próprio paciente para analisar centenas de combinações dos derivados da cannabis.
– Com essa extensa análise, é possível verificar que combinação obtém o melhor efeito nas células do paciente, e assim gerar informações para um tratamento personalizado – diz Rodrigo. – Pode ter aplicações em males variados, como Parkinson, Alzheimer, dores crônicas etc.
Como se trata de um tema delicado, pela substância escolhida, antes de abordar médicos e pacientes a startup se prepara para as entrevistas se aconselhando com o comitê de ética de seu instituto. Mas, segundo Rodrigo, a ideia da análise intensiva é reduzir o tempo de diagnóstico e obter um tratamento bem específico para cada pessoa.
E que tal ser capaz de controlar o consumo de energia elétrica de sua casa ou empresa para evitar sustos na conta no fim do mês? É essa a proposta da Glow, que reúne uma engenheira química, dois programadores e uma designer que elaboram uma solução para o desafio.
– Trata-se de um software de gerenciamento de energia em tempo real – explica a engenheira química Nayara Schmitz. – Ele também abrange um hardware e é conectável via Wi-Fi. Nossos clientes em potencial são consumidores que querem deixar de consumir energia de forma passiva, sem saber quanto está gastando… É como entrar no supermercado, pegar os produtos e só descobrir o preço na hora de ir ao caixa pagar.
O produto da Glow pode ser visualizado pelo celular, mostrando com gráficos as variações do consumo de energia ao longo do mês. Nas entrevistas, conta Nayara, a equipe vem encontrando clientes potenciais que não só estariam interessados em economizar dinheiro, mas que, independentemente disso, querem controlar e prever qual será o cálculo final da conta mensal.
Os membros das equipes são unânimes em afirmar que o Lean Startup Program os ajuda a se concentrar mais e perceber os reais rumos de suas ideias iniciais. O ritmo, sem dúvida, é puxado, mas a objetividade aumenta e traz mais luz à validação do modelo de negócio. E validação é tudo, garantem os bambas de Berkeley.
Para Robert Binder, presidente da Antera, gestora de fundos de capital que criou o IEPE, entre os grandes objetivos do Lean Startup Program está o de aproximar a iniciativa privada do meio acadêmico.
– Esperamos que esse curso possa ser replicado no Brasil inteiro, em diversas parcerias com universidades – diz Binder. – Significa trazer o linguajar do Vale do Silício para o país. A conjugação de Berkeley com a Coppead, com a incubadora e o parque tecnológico da UFRJ e com gestoras de fundo de capital como a Antera poderá ajudar a criar empresas de conhecimento exponencial.
Binder deseja que cursos como esses fomentem cada vez mais a inovação em espaços como o Parque Tecnológico da UFRJ e criem mais riqueza. Justamene para oferecer oportunidades à parcela da população mais necessitada.
– É a criação de riqueza para a redenção da pobreza, para que o conhecimento criado aqui no Parque atravesse a Linha Vermelha e chegue à Maré.
Para gestoras da incubadora e do parque, o Lean Startup Program fez diferença, sem dúvida.
– O programa é muito interessante – diz Isabela Kingston, gerente operacional da incubadora de empresas da Coppe/UFRJ. – Inclusive temos cerca de oito empresas participantes que são candidatas ao edital da incubadora, atualmente aberto. O método certamente vai prepará-las mais. E há duas residentes na incubadora que estão prestes a entrar no Parque Tecnológico, a Twist e a NetCommerce.
Clarissa Gussen e Paula Salomão, analistas de articulações corporativas do Parque Tecnológico da UFRJ, dizem que o apelo do programa serve tanto a grandes quanto pequenas empresas.
– O método Lean Startup pode ser uma ponte para que as grandes se relacionem melhor com as startups, interajam mais com elas – diz Clarissa.
– E, no caso das pequenas, ele contribui para um desenvolvimento mais franco de seus negócios, pois elas aprendem a lidar melhor com suas premissas – explica Paula. – Elas começam a crescer de maneira mais sustentável.
Mentores como André Chaves, expert em TI e membro do Alumni Coppead, proporcionaram aos membros das startups mais intimidade com o mundo dos negócios. E observadores como o general Valdemar Barroso Magno Neto, ex-reitor do Instituto Militar de Engenharia (IME), deixam a impressão de que o o princípio da startup objetiva e enxuta se espalhará por outras paragens no país.
– Temos a esperança de que essas jovens empresas do Rio, com esse método objetivo, tragam benefícios econômicos para o nosso estado, uma vez que se tornem produtivas – diz o general Valdemar. – Sobre uma possível parceria com o IME, acredito que isso possa ser discutido no futuro, pois o Exército brasileiro busca novos caminhos, entre eles o empreendedorismo. Não por acaso, estamos introduzindo uma cadeira de empreendedorismo no IME.
À tarde, as startups se reuniram para uma foto coletiva diante do prédio da administração do parque. Mentores e instrutores fizeram o mesmo junto aos professores de Berkeley ao fim de sua sessão. Agora, as startups vão aperfeiçoar sua relação com os clientes e a validação de seus modelos de negócio nas próximas semanas com mais entrevistas, e se comunicar com os professores da Califórnia virtualmente, por meio da plataforma WebEx. Os resultados finais serão apresentados em julho.